labrys, études féministes/ estudos feministas
julho/ 2016- junho 2017 /juillet 2016-juin 20

 

Vidas que não importam:

violência contra mulheres e biopolítica no norte de Minas, os efeitos da lei 11.340/2006

Cláudia Maia *

 

Resumo:

O artigo discute a violência contra mulheres e os efeitos da implantação da lei Maria da Penha em Montes Claros, no norte de Minas Gerais a partir do conceito de biopolítica proposto do Michel Foucault e retomado por Geogio Agamben e da noção de vida precária formulada por Judith Butler. Tal discussão é feita através da análise da ação do Estado no período que precede a implantação da lei, em 2006, e no período posterior à implantação da mesma. Utilizo como fontes, processos criminais e entrevistas de História Oral e semiestruturadas com operadore/as da lei.   

Palavras-chave: violência contra mulheres; gênero; biopolítica, poder.

 

No dia oito de março de 2006 – data em que se comemora o dia internacional da mulher –às doze horas da manhã, na cidade de Janaúba, no norte de Minas Gerais, após inúmeras ameaças, um marido matou a machadadas sua esposa. A cruel cena fora assistida por uma menor, filha do casal que também havia sido agredida pelo pai. Nos autos do processo, o depoimento da menor registra os detalhes do episódio:

“[...] ela estava com a mãe na cozinha, onde almoçavam, quando o pai da informada falava com M. N, “nessa história vai ficar bom só pra os filhos, caso você não retire a queixa”. Elas então arrumaram as coisas do pai e pediu para ele sair. Enquanto elas estavam no quarto, ele foi até o quintal pegou um machado e sem dizer nada desferiu um golpe de machado contra ela, vindo a acertar a mão da mãe que tentou se defender, ela então saiu para pedir socorro, tendo várias pessoas entrado na casa para ajudar a socorrer a mãe, mas esta foi acertada por três golpes de machado, “matou minha mãe como se cortasse lenha, era minha mãe toda suja de sangue e morreu nos meus braços”... (AFBF. Processo de homicídio n. 0351.06069605-8, 2006).

Cinco dias antes, mãe e filha haviam registrado denúncia na Delegacia da Mulher contra o marido, tendo o exame de corpo de delito atestado as lesões relatadas por elas. O motivo imediato do marido de causar a morte da esposa foi justamente por ela ter se recusado a retirar a denúncia. Como na maioria dos casos, a esposa já sofria a violência do marido, tendo formalizado a queixa somente quando este passou a agredir também a filha.

No inquérito, a delegada, ao pedir a prisão do acusado, argumentou que a

“[...] noticia da barbárie causou intranquilidade social. [...] Deixar o investigado solto em tais condições é contribuir com a sensação da impunidade e da ausência do Estado”(Id. Ibidem).

 A preocupação primeira da delegada, como se lê, não é com o crime praticado ou com os corretivos que se espera ao autor, mas com a imagem do Estado, já que o crime foi amplamente noticiado, causando comoção no município. Prender o marido, após a efetivação das suas ameaças, mostraria, no entanto, a “presença” efetiva do Estado. Contudo, o Estado já se fazia ausente, na medida em que deixou de zelar pela vida dessa mulher, quando ela buscou proteção, cinco dias antes de ser cruelmente assassinada.

A morte dela resulta de um “continum de atos de violência” (Russel; Caputti, 1992 apud Pasinato, 2011) que caracteriza o crime de feminicídio, termo que vem sendo construído pelas teóricas feministas para expressar o assassinato de mulheres, motivado por questões de gênero, quando o que se procura eliminar não é apenas um corpo, mas as expressões do feminino que ele carrega, seus modos, experiências, enunciados e signos. Nesse sentido, o corpo feminino torna-se um território de disputas e de inscrição de posse e de poder masculino (Segato, 2015), por isso é comum, nesses crimes, o requinte de crueldade: matou a esposa não com uma, mas com três machadadas, na frente da filha. É um tipo de intensificação da morte e emissão de uma mensagem.

Compõe o quadro de definição do feminicídio a impunidade; assim, teóricas como Rita Segato e Marcela Lagarde têm chamado a atenção para a “rede de proteção dos responsáveis” (Segato,2005) que cercam tais mortes e defendem que o feminicído deve ser concebido como um crime de Estado. Segundo Lagarde,

“Para que se dê o feminicídio concorrem de maneira criminal o silêncio, a omissão, a negligência e a conveniência de autoridades encarregadas de prevenir e erradicar esses crimes. Há feminicídio quando o Estado não dá garantias para as mulheres e não cria condições de segurança para suas vidas na comunidade, em suas casas, nos espaços de trabalho e de lazer. Mais ainda quando as autoridades não realizam com eficiência suas funções. Por isso o feminicídio é um crime de Estado” (Lagarde, 2004,p.5Apud Pasinato, 2011,p.232).

O poder de morte do marido sobre a vida da esposa, no caso aqui relatado, encontra seus fundamentos, portanto, na cultura patriarcal, nas hierarquias de gênero e no processo histórico, como têm ressaltado os estudos sobre violência de gênero, mas também na omissão e violência do Estado; afinal, trata-se de um ‘objeto’ de preocupação menor o cuidado e a efetiva execução do que prevê a lei que trata exclusivamente de crimes dessa natureza.

Pelos históricos de assassinatos de mulheres, no Brasil, poderíamos dizer que o assassinato ‘começa’ a acontecer quando a ‘justiça’ não faz a sua parte e trata a constância da violência como algo ‘normal’ e ‘banal’. Por isso, a cruel morte relatada aqui não é um caso isolado; ela compõe mais um número na assustadora estatística de assassinatos de mulheres levantada pelo Mapa da violência de 2015, que registrou um total de 106.093 mulheres mortas entre 1980 e 2013. Júlio Jacob Waiselfisz, autor do Mapa da violência no Brasil, conclui seu relatório com o seguinte comentário:

“Recentemente, Raúl Eugenio Zaffaroni, Ministro da Suprema Corte Argentina e diretor do Departamento de Direito Penal e Criminologia na Universidade de Buenos Aires, colocava em uma entrevista: “Cada país tem o número de presos que decide politicamente ter”. Por minha conta e risco, complementaria a afirmação do ilustre professor: ‘Cada país tem o número de feminicídio que decide politicamente ter, assim como o número de condenações por essa agressão’ ”.(grifos meus) (Waiselfisz, 2015, p.76).

As conclusões e comentário de Waiselfisz apontam para aquilo que Michel Foucault chamou, de maneira mais geral, de biopolítica.

Foucault começou a elaborar os conceitos de biopolítica e biopoder no último capítulo da sua História da sexualidade 1: a vontade de saber, para expressar a organização do poder sobre a vida. Segundo ele, a partir do século XVII, o poder soberano, caracterizado pelo direito – absoluto ou limitado – de causar a morte ou deixar viver, foi sendo substituído pelo poder político de gerir a vida (Foucault, 1988, p.128). Posteriormente, em Segurança, território, população, ele define o biopoder como “[...]o conjunto dos mecanismos pelos quais aquilo que, na espécie humana, constitui suas características biológicas fundamentais vai poder entrar numa política, numa estratégia política, numa estratégia geral de poder” (Foucault, 2008 : 3).Ou seja, a partir do século XVIII, as sociedades ocidentais passaram a levar em conta, nos cálculos do poder, a vida natural do cidadão”. (

Na esteira de Foucault, Giorgio Agamben argumenta que a característica da biopolítica, na contemporaneidade, mais do que a integração da vida natural nos cálculos e previsões do poder estatal – ou seja, a politização da vida – o que está em questão é a vida nua do cidadão, sobre a qual se baseia o poder soberano. O conceito de vida nua, central em sua análise, é formulado a partir homo sacer, uma figura ambivalente do direito romano arcaico que, ao mesmo tempo, não pode ser sacrificada  e, entretanto, pode ser (eliminada) morto por qualquer um, impunemente. O que define a condição do homo sacer   é, assim, o caráter da “dupla exclusão em que se encontra preso e da violência à qual se encontra exposto”, já que sua morte insancionável, não é considerada nem como sacrifício, nem como homicídio. A vida nua seria essa vida matável e insacrificável do homo sacer (Agamben, 2007:90).

Para Agamben, na biopolítica atual, cada sociedade fixa e redefine, continuamente, na vida, os limites de inclusão e exclusão, nos direitos de cidadania, assim como “um limiar além do qual a vida cessa de ter valor jurídico”, de ser politicamente relevante e, portanto, é lugar de uma decisão soberana, podendo ser impunemente eliminada. Conforme Agamben, toda sociedade, mesmo as mais modernas, define quais sejam seus “homens sacros”, ou seja, quais vidas merecem ser protegidas e quais podem ser eliminadas. A vida nua, portanto, corresponde ao indivíduo que está fora desse limite, ou seja, que possui algum recorte social (gênero, religião, condição social, nacionalidade, dentre outros) que faz com que ele perca seus direitos de cidadania, isto é, os direitos de proteção assegurados pelo Estado, e por isso é uma vida matável. (Agamben, 2007:149).

Mais recentemente, Judith Butler avança nessa discussão – ao propor pensar a vida para além dos direitos de cidadania – apresentando outra chave de leitura para analisar a biopolítica contemporânea, ao introduzir a noção de vida precária. Embora sua análise se centre em “quadros de guerra” – recorte que dá título ao seu livro – cujo enfoque é mais especificamente o contexto da guerra do EUA contra o Iraque e a tortura dos prisioneiros em Guantánamo; sua analítica é útil para pensarmos a ação do Estado, em relação à violência de gênero.

Orientando-se pela questão “o que é uma vida vivível?, Butler (2016) argumenta que, para uma vida ser considerada lesada, perdida ou “matável”, ela precisa, primeiro, ser considerada viva.

“Se certas vidas não são qualificadas como vidas ou se, desde o começo, não são concebíveis como vidas de acordo com certos enquadramentos epistemológicos [mas também políticos, econômicos, religiosos, de gênero], então essas vidas nunca serão vividas nem perdidas no sentido pleno dessas palavras” (Butler, 2016:13).

 São, portanto, os enquadramentos que decidem, diferenciam e definem quais vidas podem ser apreendias e reconhecíveis como vida e, quais vidas nunca reunirão condições de serem reconhecidas como tal. É, também, por meios dos enquadramentos que temos à nossa disposição que, segundo ela, entendemos a precariedade da vida. Assim, afirmar que uma vida é precária, significa não apenas apreendê-la como vida, mas também a precariedade como um aspecto no que está vivo. Outro importante aspecto ressaltado por Butler, em sua análise, é que, nos enquadramentos que definem uma vida, ela só é considerada como tal na medida em que é digna de ser enlutada. Ou seja, a vida só tem valor, quando ela é passível de luto (Idem:32), e todo luto é atribuído à perda de algo que possui valor ou alguma correspondência afetiva, do contrário, torna-se indiferente.

Para ser vivível, conforme destaca Butler, a vida exige apoio e condições possibilitadoras  para que ela possa ser mantida como vida. A precariedade da vida, portanto, consiste no “fato de que a vida de alguém está sempre, de alguma forma, nas mãos do outro”; (Idem:.31). Por isso,

“[...] afirmar que a vida é precária é afirmar que a possibilidade de sua manutenção depende, fundamentalmente, das condições sociais e políticas, e não somente de um impulso interno para viver...” (Idem:40).

A condição precária designa, portanto, uma condição politicamente induzida.

Nesse sentido, a precariedade é condição generalizada de todos que vivem em sociedade, entretanto a questão a ser colocada é por que algumas vidas são mais precárias que outras? Ou seja, a condição diferenciada de precariedade, pois cada sociedade constitui, historicamente, um conjunto de ações, práticas, leis, organizações sociais e políticas, com objetivo de “maximizar a precariedade para alguns e minimizar a precariedade para outros” (Idem:.41).

O que equivale a decidir quais/quantas vidas são politicamente relevantes e devem ser preservadas e quais/quantas não importam, podendo ser lesadas e eliminadas. Nas palavras da autora,

“(...) aqueles cujas vidas não são “consideradas” potencialmente lamentáveis e, por conseguinte, valiosas, são obrigados a suportar a carga da fome, do subemprego, da privação de direitos legais e da exposição diferenciada à violência e a morte” (Bulter, 2016: 45-46).

Isso é, em linhas gerais, a biopolítica contemporânea.

É nesse quadro que proponho pensar as mulheres em situação de violência doméstica e familiar como “vidas precárias”, “vidas matáveis” politicamente, não passíveis de luto, uma vez que, desprotegidas ou parcialmente protegidas por sistemas jurídicos, redes de assistência e instituições deficientes, estão expostas não só à violência patriarcal, mas também à violência de Estado.

Assim, a proposta aqui é refletir sobre a ação do Estado, em relação à violência contra mulheres por meio da análise comparativa entre dois momentos históricos: um período que precede a Lei Maria da Penha (LMP) e o período posterior à implantação dessa lei, tendo como foco a cidade polo de Montes Claros, no norte de Minas Gerais. Procuro observar se a LMP tem contribuído para minimizar a precariedade de mulheres em situação de violência.[1]

“Na época a gente queria uma Maria da Penha, mas não existia...”

A lei Maria da Penha (LMP), sancionada em 2006, pelo governo brasileiro, respondeu às demandas da sociedade e do movimento feminista em particular, de qualificar e criminalizar a violência contra mulheres. Antes da lei, esse tipo de violência, quando havia a denúncia e esta era aceita pelas autoridades policiais, era classificado pelo código penal brasileiro nos crimes de lesão corporal, tentativa de homicídio, estupro ou tentativa de estupro. Além de não ser considerada violência, logo crime, as agressões psicológicas, patrimonial e moral, também não se considerava a violência sexual (ou seja, como estupro ou tentativa de estupro) quando ocorria entre casais legalmente constituídos ou de uniões estáveis. 

Em pesquisa anterior, realizada no âmbito do Grupo de Pesquisa Gênero e Violência da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), analisamos 116 processos criminais de violência conjugal contra mulheres, sendo 104 de lesão corporal e 12 de tentativa de homicídio, ocorridos entre 1970 e 2006, nas cidades de Janaúba e Montes Claros (Maia, 2011; Maia et. al., 2010; Maia e Jardim, 2012). Desse montante, que consideramos uma amostra irrisória, uma parte muito pequena dos processos foi concluída.[2] Nos processos concluídos de lesão corporal, os réus foram absolvidos por falta de provas, pois as agressões ocorreram na privacidade do lar, sem testemunhas e entre a fala do marido e da esposa agredida, o juiz sempre tendia a acreditar no marido, julgando, por fim, improcedente a denúncia. Nos casos em que houve a condenação, por sua vez, devido ao tempo percorrido entre a denúncia até o julgamento, a punibilidade do réu foi extinta.

Wânia Pasinato,  por sua vez, em pesquisa realizada na Zona sul da cidade de São Paulo, no período de 1984-1989, chamou a atenção para a desqualificação dos crimes de lesão corporal e tentativa de homicídio contra mulheres. Segundo a autora,

“[...]em alguns casos, foi possível observar que a desclassificação do crime – e a redução da pena aplicada – não se deu por fatores objetivos como a gravidade das lesões provocadas nas vítimas, mas por razões subjetivas como o fato de o agressor ter agido sob violenta emoção” (Pasinato, 2004:71).

A criação, em 1995, dos Juizados Especiais Criminais (JECRIM), com objetivo de promover a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais consideradas de menor potencial ofensivo, aumentou o sentimento de impunidade e de falta de proteção do Estado, na medida em que esse juizado primava pelas transações penais. O acesso das mulheres em situação de violência à justiça tornou-se ainda mais precário, pois os processos de violência doméstica e familiar passaram a ser julgados por esses juizados, sendo que, nos poucos casos em que havia condenação, ou seja, a transação penal, a pena se reduzia ao pagamento de cestas básicas ou de serviços comunitários. Segundo Calazans e Cortes

“[...] 90% dos casos de violência doméstica julgados nos JECRIMS terminavam em arquivamento nas audiências de conciliação, sem que as mulheres encontrassem uma resposta efetiva ao poder público à violência sofrida”. (2011: 42),

No Mapa da Violência de 2015, Júlio Waiselfisz observa que, entre 1980 e 2006 (período que precede a LMP), houve um aumento de 7,6% no número de assassinatos de mulheres; embora não seja objeto de seu estudo identificar os fatores desse aumento, ele sugere, em suas conclusões, ser justamente a impunidade o principal deles:

“Se a impunidade é amplamente prevalecente nos homicídios dolosos em geral, com muito mais razão, pensamos, deve ser norma nos casos de homicídio de mulheres. A normalidade da violência contra a mulher no horizonte cultural do patriarcalismo justifica, e mesmo “autoriza” que o homem pratique essa violência, com a finalidade de punir e corrigir comportamentos femininos que transgridem o papel esperado de mãe, de esposa e de dona de casa”. (Waiselfisz, 2015:75).

Por outro lado, a justificação e/ou desqualificação do crime por meio de estratégias que convertem a vítima em culpada – por ela ter supostamente transgredido papéis que se espera de uma mulher, no universo patriarcal – é também um elemento que propicia a impunidade. A leitura e análise dos processos criminais ocorridos em Montes Claros e Janaúba, permitiram perceber essa estratégia nos discursos dos advogados, por vezes reiterados pelos juízes, que possibilita pensar a “lógica justificadora” do crime e, ao mesmo tempo, a desqualificação da vida de mulheres vítimas. É recorrente, nos processos, a construção da imagem da vítima como prostituta, mulher infiel, traiçoeira, mentirosa, mãe desnaturada, viciada em drogas, dentre outros sentidos, como se esses ‘predicativos’ servissem de instrumentos para orientar o juiz. Quando se refere à mulher, o conceito de vida é absolutamente reduzido à perspectiva moral e determinada pelo comportamento social.

Esses sentidos produzem imagens de sujeitos e corpos marcados por limites de exclusão, lançados para fora do enquadramento que define a vida passível de luto, digna de proteção e subsistência. Isso equivale decidir o valor ou desvalor dessas vidas e desses corpos. Significa dizer que a vida dessas mulheres não é vivível, por isso, pode ser lesada, eliminada e perdida. Nas palavras de Butler

“[...]esses enquadramentos normativos estabelecem de antemão que tipo de vida será digna de ser vivida, que vida será digna de ser preservada e que vida será digna de ser lamentada”. (2016:85),

Uma das primeiras ações institucionais dos Estados brasileiros com vistas a “combater” a impunidade e a violência contra mulheres foi a Delegacia de Atendimento às Mulheres (DEAM), criada a partir do final de 1980. Em Montes Claros, a DEAM foi instalada em 1987, sendo uma das primeiras do país, mas, assim como em outros lugares, ela também teve seu papel e funcionalidades minimizadas até seu fechamento, 20 anos depois, em 2007, com a criação das Áreas Integradas de Segurança Pública (AISPs), em cidades de médio e grande porte pelo Estado de Minas Gerais. As AISPs passaram a integrar, num mesmo espaço, as polícias militar e civil, organizadas no município por regiões, a partir das estatísticas de ocorrências de crimes e deveriam ser instaladas em locais mais próximos ao acesso do cidadão. Isso significou o fechamento das delegacias especializadas, dentre elas, a Delegacia da Mulher.

Apesar da importância das DEAMs, os diversos estudos realizados sobre essas delegacias no Brasil denunciaram que elas se tornaram alvo de preconceitos e deboches no âmbito da própria polícia; esses estudos mostraram ainda a falta de preparo e interesse dos/as policiais, a maioria homens, que compartilhavam a ideia de que a violência contra mulheres é um mero “probleminha familiar”, desencorajando o registro da denúncia, como lembra a Policial 3. Segundo ela, muitas vezes, quando a vítima chegava a delegacia, o

“[...] delegado fala que não ia prender o agressor, inclusive faz chantagens ‘o que você vai comer? Quem vai pagar as contas?’. Parece que há uma cooperativa de homens” (P3, 2011).

Os estudos identificaram ainda a falta de equipe qualificada; de recursos, de materiais de consumo e infraestrutura, falta de reconhecimento e prestígio no âmbito da esfera policial devido seu menor poder ofensivo (Souza, 2009; Pasinato, 2004; 2005). As condições precárias de funcionamento da DEAM de Montes Claros foram, por sua vez, lembradas por uma policial em relato de História oral:

“Antigamente não tinha viatura para poder mandar fazer a intimação, ou se tivesse viatura não tinha gasolina. Eu sou dessa época da polícia ainda. Então você pedia a mulher para poder levar a intimação, aí ela não voltava. E muitas vezes ela não voltava por que ela nem existia mais”. (P1, 2010)[3]

Percebemos, no relato, que faltavam investimentos (políticos e econômico) por parte do poder público para dar à DEAM melhor operacionalidade para que ela pudesse, de fato, proteger a vida das mulheres. Assim, em vez de manter a vida, o Estado, de certa maneira, causa a morte, como podemos perceber em outro caso relatado por essa policial. Ela lembra que havia feito três boletins de ocorrência num único dia, para a mesma vítima, e encaminhado para demais providências. No dia seguinte, entretanto, quando chegou para trabalhar, a colega lhe informou que aquela mulher já havia sido assassinada. Um vizinho havia ligado “falando que tinha escutado um tiro, (...) o marido dela matou ela” (P1, 2010).

Nesse caso, assim como em muitos outros, a história se repetiu, a mulher foi em busca de ajuda e proteção do Estado, por meio da polícia, mas seu direito foi negligenciado. A policial fez o seu trabalho ao registrar e encaminhar os boletins de ocorrência, mas não houve continuidade do processo e a vítima teve sua vida eliminada.

Assim, as dificuldades em caracterizar e impetrar uma denúncia; a impunidade dos agressores, as transações penais; a lentidão da justiça, a desqualificação da vítima e a ausência de políticas de manutenção e proteção da vida de mulheres vítimas indicam as condições de precariedade dessas mulheres, expostas não só à violência masculina, mas também do próprio Estado.

Em sua análise, Judith Butler sublinha que,

“[...] afirmar que uma vida é precária exige não apenas que a vida seja apreendida como uma vida, mas também que a precariedade seja um aspecto do que é apreendido no que está vivo” (Butler, 2016:30).

Ela argumenta a favor de uma maneira “inclusiva e igualitária de reconhecer a precariedade” para que isso resulte em políticas sociais efetivas de habitação, trabalho, alimentação, assistência médica, jurídica, proteção; pois, “ [...] a vida requer que várias condições sociais e econômicas sejam atendidas para ser mantida como uma vida” (Idem:.31). A precariedade indica fragilidade e a lei supostamente agiria no intuito de preservar, justamente em função dessa precariedade. Se uma maior precariedade/fragilidade não é reconhecida pelos dispositivos jurídicos, obviamente ‘uma vida’ passaria a ser mais exposta e sujeita a todo tipo de ação contra si, por exemplo, a violência praticada por outro sobre esse corpo, afinal, ‘algumas vidas são mais precárias que outras’. Acredito que a lei Maria da Penha, de certa maneira, resulta do entendimento e apreensão da precariedade da vida de mulheres em situação de violência.

A precariedade em pauta: a LMP

Como tem sido constantemente reafirmado em diversos estudos, a LMP representou um grande avanço em termos legislativos ao estabelecer as medidas protetivas de urgência às mulheres vítimas, assegurar formas de assistência social, definir, tipificar a violência doméstica e familiar contra as mulheres como toda ação ou omissão baseada no gênero e reconhecer esse tipo de violência como violação dos direitos humanos. Além disso, a lei estabeleceu as formas de violência em qualquer relação íntima de afeto, independentemente da orientação sexual da mulher.

Dentre as medidas estabelecidas, a LMP aumentou o curso da pena para o agressor, considerou a violência doméstica e familiar contra mulheres uma violação aos direitos humanos, e tornou-a um crime público – não mais apenas em âmbito pessoal. Isso significou que a denúncia pode ser feita por qualquer cidadão (não mais somente pela vítima) e que a queixa não pode mais ser retirada, como era muito comum. Alterou o art. 313 do Código Penal, acrescentando a prisão preventiva dos agressores, nos casos de violência doméstica e familiar contra mulheres, e estabeleceu as medidas protetivas de urgência.

Dentre outras providências, as medidas afastam o agressor da vítima, obrigando-o a manter distância dela, isso confere maior segurança e possibilita a denúncia. A LMP dispôs ainda sobre a criação de serviços especializados de atendimento às mulheres em situação de violência, como casas-abrigos, núcleos de Defensoria e as Delegacias Especializadas de Atendimento às Mulheres, a serem instaladas e mantidas pelos estados brasileiros (Brasil, 2012).

O estudo realizado por Ederson da Cruz Pereira, em Montes Claros, a partir de registros de denúncias recebidas pela política militar, sugere uma redução gradativa no número de ocorrências, a partir de 2012, com a implantação da lei. Conforme Pereira (2015), nos últimos quatro anos foram registradas, nesse município, 10.799 ocorrências de violência contra mulheres; entre 2013 e 2014, ele observou uma queda de -12,97% no número de registros, o que pode indicar uma redução da violência. Entretanto, o período de redução nos índices corresponde ao de reabertura da DEAM, em Montes Claros, que ocorreu 2013; isso pode ter significado uma ampliação nos canais de denúncia, logo a dispersão destas, haja vista que os dados contabilizados por Pereira (2015) se restringem aos da polícia militar.

Por outro lado, a reabertura da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher em situação de violência consiste, sem dúvida, num dos efeitos positivos da implantação da LMP no município.[4] Ao contrário do período precedente, agora a DEAM está mais bem equipada, conta com uma equipe multidisciplinar,[5] conforme estabelece a lei, e com melhores instalações, ocupando um primeiro andar predial, com sete salas amplas e equipadas para atendimento ao público e tem, à sua disposição, duas viaturas (P4, 2016). A DEAM é, hoje, de acordo com a Delegada, a delegacia de Montes Claros que mais conclui e encaminha inquéritos à justiça, sendo em torno de 50 por mês.[6] Ao contrário da fase anterior, essa delegacia está munida de aparato legal, que evita a retirada das denúncias e meios para intimar os agressores e acionar as medidas protetivas para as mulheres. Em média, a delegacia atende dez mulheres por dia, expede cinco medidas protetivas por dia e cerca de 100 por mês; destas em média 95% são deferidas (P5, 2016). Recentemente, a DEAM de Montes Claros tornou-se referência para o Estado de Minas Gerais.

Outro importante efeito da LMP, na esfera policial, em Montes Claros, foi a criação, em 2011, do programa Patrulhas de Prevenção à Violência Doméstica (PPVD), com policiais militares qualificados, especificamente, para prestarem as primeiras assistências às mulheres em situação de violência e fazerem os encaminhamentos para os serviços de apoio e procederem ao registro das ocorrências. Esses policiais têm ainda como função fazer o acompanhamento da vítima, após o primeiro atendimento, para prevenir a repetição da violência visando a sua proteção.

Não obstante a importância dessas ações, elas não são suficientes para assegurar  efetiva aplicação da LMP, a proteção das mulheres vítimas e o fim da impunidade. Sem dúvida, a lei Maria da Penha deu maior visibilidade à violência contra mulheres e tem encorajado um número cada vez maior de denúncias, por parte de mulheres vítimas que se veem, agora, mais bem amparadas. Entretanto, seu funcionamento/aplicação, pelo menos em Montes Claros, ainda é deficitária. Dentre as deficiências, verificamos: a ausência de formação sistemática e continuada dos operadores da lei; os especialistas da equipe multidisciplinar da DEAM não pertencem ao quadro efetivo de funcionários; ainda há queixas de vítimas que são desencorajadas a registrar a denúncia tanto na Delegacia, quanto na Polícia Militar; ainda se mantém a falta de prestígio da Delegacia da Mulher, no âmbito da instituição policial e, consequentemente, a falta de valorização do trabalho das policiais, no que se refere à progressão na carreira; não existem plantões na Delegacia da Mulher, por haver apenas uma delegada; o número de policiais e viaturas do programa PPVD da Polícia Militar não é suficiente para o tamanho da população; ausência de instrumentos de fiscalização do cumprimento das medidas protetivas; ausência de um protocolo oficial que estabelece a Rede de Assistência às Mulheres em situação de violência ou um órgão específico de coordenação (Martinez, 2016); a instituição policial ainda é constituída e mantenedora de uma estrutura e formação sexista (PEM, 2016); ausência de trabalho com os agressores.[7]

No que se refere à esfera jurídica, uma importante ação, no município foi, em 2005 a criação da Defensoria Especializada no Atendimento às Mulheres em Situação de violência, com incentivos do governo federal. Essa criação teve como objetivo  prestar assistência jurídica, psicossocial e orientação às mulheres com renda individual de até três salários mínimos ou renda família de até cinco salários. Não obstante ao trabalho positivo da Defensoria e ao elevado número de atendimentos feito por ano, dois anos após a sua criação, ela foi restrita a apenas um Núcleo em Defesa das Mulheres em situação de violência da Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (Rocha, 2012 : 57-58).

Ainda nessa esfera, uma importante medida prevista na LMP é a criação do Juizado Especial para julgar os casos de violência Doméstica e familiar, com vistas a dar maior celeridade aos processos. Esses Juizados teriam competência criminal e civil, abrangendo as questões de família decorrentes da violência contra mulheres como pensão alimentícia, guarda dos filhos, divisão de bens e propriedades, entre outra, e deveriam contar também com uma equipe multidisciplinar para auxiliar o juiz em suas decisões.

 Entretanto, foram poucos os Estados a implantar esses juizados nos municípios, e Montes Claros não é exceção. A ausência desse Juizado demonstra que os efeitos da LMP, no que se refere a assegurar o acesso à justiça, por parte de mulheres vítimas, são menos expressivos. Assim, os inquéritos concluídos pela Delegacia da Mulher de Montes Claros, bem como os pedidos de medidas protetivas, são encaminhados para a 1ª e 2ª vara criminal e, ao lado de centenas de outros processos, vão se acumulando. Embora ainda não haja estudos sobre o tratamento dos crimes da lei 11.340, na esfera jurídica, é possível sugerir que não houve significativa redução no tempo de análise e julgamento dos processos. Conforme a LPM, as medidas protetivas de urgência, por exemplo, deveriam ser expedidas no prazo de quarenta e oito horas, entretanto, atualmente, esse prazo tem demorado em média sete dias. Em pesquisa realizada na capital mineira, Pasinato (2010:228) averiguou, dentre outras deficiências, a falta de integração das Varas Judiciais e a Rede de Assistência às mulheres em situação de violência e que o deferimento das medidas protetivas levam até um ano para ocorrer.

Considerações finais

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) realizou, em 2015, uma pesquisa que avaliou a efetividade da LMP, em nível nacional. Os pesquisadores apontaram o papel importante da lei para conter a violência de gênero. Concluíram, entretanto, que sua efetividade não se deu

 “[...] de maneira uniforme no país, uma vez que a sua eficácia depende da institucionalização de vários serviços protetivos nas localidades, que se deu de forma desigual no território” (Cerqueira, et. al, 2015: 5).

A “efetivação” de tais serviços depende, em grande medida, do poder público estadual e municipal, daí as diferenças e desigualdades também na aplicação da lei e sua efetividade, sobretudo nos Estados e municípios mais pobres.

Por sua vez, o Data Senado, também em 2015, avaliou o efeito positivo da LMP, conforme a percepção das mulheres: 70% da entrevistadas que possuem ensino superior acreditam na melhoria com a implantação da lei; esse número reduz entre mulheres que cursaram até o ensino médio, para 53% e reduz ainda mais, 42%, entre as que possuem apenas o ensino fundamental.

“Para esse último grupo e entre as mulheres de cor preta, a avaliação do efeito positivo da lei foi menor no que tange a proteção à mulher. Em ambos o percentual ficou abaixo de 50%” (DataSenado, 2015, p.4).

Ou seja, as mulheres em geral, em maior situação de vulnerabilidade e pobreza – as negras menos escolarizadas – sentem-se menos protegidas pelo Estado, no que se refere ao acesso à justiça e ao direito a uma vida sem violência. 

Percebe-se, pelos resultados dessas pesquisas, que a precariedade das mulheres que mais dependem dos serviços do Estado – como nas localidades mais pobres ou as mulheres negras – é maximizada. Elas estão mais expostas à omissão e violência do estado e às condições precárias de vida. Retomo então Judith Butler, para quem “a condição precária designa a condição politicamente induzida na qual certas populações sofrem com redes sociais e econômicas de apoio deficientes e ficam expostas de forma diferenciada às violações, à violência e a à morte”. A condição precária, assim, “também caracteriza a condição politicamente induzida de maximização da precariedade para populações”, que não tendo outra opção a recorrer ao não ser os serviços públicos, ficam “expostas à violência arbitrária do Estado...” (Butler, 2916, p.46-47).

Não resta dúvida de que a Lei Maria da Penha foi um importante passo para apreensão da precariedade das mulheres em situação de violência, mas, pelo visto, ainda são necessários outros investimentos políticos e econômicos, por parte do Estado, para que ela resulte, de fato, em proteção e manutenção da vida das mulheres. É necessária, cada vez mais, uma politização do discurso com o intuito não só preventivo, mas acima de tudo, com fins de acabar com as mais variadas formas de violência sofridas pela mulher.

Problematizar a violência contra as mulheres e a precariedade de suas vidas significa contribuir para a invenção de outros dispositivos que não àqueles estabelecidos pelo universo jurídico-patriarcal, aquele que valora vidas e define a sua continuidade ou o seu fim. Se é necessário o recurso ao dispositivo jurídico, que ele seja por inclusão e não por esquecimento. Somente quando a violência contra a mulher se tornar um recorte ou campo problemático, seja na escola, na família ou nos mais diversos grupos sociais, é que não nos deixaremos cair na armadilha da indiferença, afinal, o que estará em jogo será sempre a singularidade de uma vida. É necessário fazer com que ‘a mulher, uma vida’ possa se tornar uma linha, um horizonte, um plano visível, em que toda a enunciação sobre si seja criada por ela mesma. Somente após essa construção horizontal de sua particular cartografia, com seus mais diversos sentidos, é que algo realmente novo pode advir.

Fontes orais

P1 (Policial 1). Entrevista de História Oral. Montes Claros, julho de 2010.

P3 (Policial 3). Entrevista de História Oral. Montes Claros, agosto de 2011.

P4 (Policial 4). Entrevista semi-estruturada. Montes Claros, abril de 2016.

P5 (Policial 5). Entrevista de História Oral. Montes Claros, abril de 2016.

PEM (Profissional de Equipe Muldisciplinar 1). Montes Claros, maio de 2016.

 

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Nota biográfica

Cláudia Maia

Possui pós-doutorado em História na Universidade Nova de Lisboa. Doutora em História pela UnB, com área de concentração em Estudos Feministas e de gênero, com período sanduíche na École dês Hautes Études em Sciences Sociales (EHESS); é professora do Departamento de História e do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes); líder do Grupo de Pesquisa Gênero e Violência – CNPq. É autora dos livros Lugar e Trecho: gênero, migrações e reciprocidade no Jequitinhonha. Montes Claros, 2002; A invenção da solteirona: conjugalidade moderna e terror moral. Florianópolis: Ed. Mulheres, 2011; e co-organizadora dos livros Mulheres, violência e justiça no norte de Minas. São Paulo: Annablume, 2012; História das Mulheres e do gênero em Minas Gerais, Ed. Mulheres, 2015; Tem ainda vários artigos e capítulos de livros publicados. É bolsista de produtividade da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (BIPDT/FAPEMIG).


  Notas

* Uma versão desse texto foi publicada Ebook “Mulheres e violências: interserccionalidades”, Brasília: Technopolitik, 2017.

[1] Para o primeiro período utilizo, sobretudo, a análise de processos criminais ocorridos entre 1970, quando a violência contra mulheres começa a ser denunciada e visibilizada no Brasil, e 2006, que corresponde à data de criação da lei. No período procedente, utilizo entrevista de história oral com operadores do Direto, Agentes de Segurança Pública, Delegadas – aqui denominadas genericamente de Policiais (P) e Membros das Equipes Multidisciplinares (MEP) de apoio.

[2]Entendemos que a quantidade dos processos recolhidos na primeira vara criminal do Arquivo do Fórum Bias Fortes de Janaúba e no Acervo do Fórum Gonçalves Chaves de Montes Claros, certamente não correspondem à totalidade dos casos que chegaram ao conhecimento da justiça. Da mesma forma, sabemos que a maior parte dos casos de violência conjugal não chegava nem mesmo a ser denunciada. Assim, consideramos que os processos encontrados correspondem a apenas uma pequena amostra da violência conjugal nos dois municípios, recolhida aleatoriamente nos arquivos, tendo como critério o período, o tipo de crime e os sujeitos envolvidos: casais legalmente constituídos, amasiados, separados ou namorados.

[3] A LMP no parágrafo único do art. 21 proibiu que a notificação ou intimação seja entregue, pela ofendida, ao agressor, fato anteriormente comum na DEAM de Montes Claros, conforme narrativa da Agente 1.

[4] Outros serviços criados no município, como a Casa Abrigo são também efeitos positivos da LMP. Entretanto, para esse trabalho, vou me deter à esfera policial e jurídica.

[5]A equipe multidisciplinar da DEAM de Montes Claros é composta por uma Delegada de Polícia Civil, uma Chefe de Cartório, quatro escrivães, um Inspetor, quatro Investigadores fixos e ainda, por meio de convênios, dois advogados Mediadores de Conflito, duas psicólogas, sendo uma psicóloga analista da Polícia Civil, uma Assistente Social, uma Servente Geral.

[6] Não há, entretanto, ainda, estudos que analisem o tempo de julgamento e/ou os resultados desses processos na justiça no município.

[7]Podemos elencar também, nesse rol de deficiências, a ausência de projetos de educação que visem a modificar a cultura da violência, bem como os valores do patriarcado. O que temos presenciado, porém, é o avanço de projetos como o “Escola sem partido”, que não apenas retira as discussões de gênero do âmbito da educação nacional, como também tem buscado criminalizar tais discussões (cf. PL 1411/2015 de autoria do Deputado Rogério Marinho). Isso significa retirar do Estado a responsabilidade de investimentos e ações para acabar com as desigualdades de gênero, bem como com as lesões e mortes provocadas por essas desigualdades.

labrys, études féministes/ estudos feministas
julho/ 2016- junho 2017 /juillet 2016-juin 20